A sala!
Caríssimo leitor, atente que um setup profissional de nada serve se a sala onde está tem acústica pobre,
portanto transformar a sua sala em um espaço adequado para gravação e
reprodução musical deve ser um dos veios mais importantes dentre os muitos que
compõe o seu discernimento. Hoje, com essa pequena aula vou te dar um norte nessa direção e se precisar de ajuda, basta pedir. Um abraço!
A)
Introdução
O tema "acústica de salas" envolve muitos fundamentos
que permeiam a física, biologia, arquitetura, entre tantos outros, sendo a
maioria destes de alta complexidade e cheio de contas, entretanto é possível
ter uma visão abrangente de como os sons se comportam dentro de ambientes
fechados sem nos aprofundarmos na matemática para que possamos condicionar esses
espaços onde gravamos e escutamos música almejando melhores resultados.
Para isso iremos utilizar duas planilhas de Excel para resolver a
grande maioria dos problemas de acústica de salas automaticamente, mas primeiro
precisamos entender os preceitos básicos para sabermos utilizá-las.
B) Fundamentos
Os quatro principais fundamentos da acústica são:
Reflexão:
Isso dá-se quando a onda sonora não é absorvida pela superfície
onde incide e volta ao ambiente no mesmo ângulo de incidência. Podemos
visualizar isso de uma maneira fácil utilizando um laser pointer, desses de
palestra, apontando-o nas superfícies reflexivas e vendo sua reflexão; o som
comporta-se de maneira similar. Materiais muito lisos, como vidro são muito
reflexivos.
Absorção:
É quando a onda sonora é absorvida pelo material onde incide,
assim como a luz é absorvida por uma parede pintada de preto fosco. Para isso o
material tem que ser poroso, como espuma, veludo ou lã de pet (melhor
substituta das lãs minerais), por exemplo.
Difusão:
É o fenômeno que faz com que as ondas sonoras se espalhem em
diversas direções dentro do ambiente, sem uma direção determinada. Isso cria um
campo difuso do mesmo jeito que uma luz indireta embutida ilumina um ambiente
suavemente. Não existe material difusor, mas sim uma combinação de técnicas
construtivas que tornam uma superfície difusora, como um painel de quadrados de
madeira cada um com tamanhos, alturas, profundidades e orientações.
Transmissão:
É quando o som atravessa uma superfície e aparece do outro lado
atenuado, assim como a luz passa por um papel translúcido. Quanto maior for a
rigidez, densidade e a espessura do material, menor é a transmissão.
C) Reverberação:
A reverberação é o mais importante conceito que devemos lidar na
acústica de salas.
A reverberação é constituída por muitas reflexões com intervalo
muito pequenos entre si (millisegundos) que se espalham em todas as direções formando
um campo difuso. A medida em segundos desse campo difuso desde sua formação até
quando se extingue é denominada de RT60.
Não existe uma norma que determine o quanto de reverberação
devemos ter em nossas salas de gravação e de escuta de música, mas é notório
que em auditórios onde apresenta-se música os tempos de reverberação são bem
maiores do que nas salas de gravação de voz, por exemplo.
Quando há muita reverberação na sala, dizemos que a sala é viva.
Quando há pouca, dizemos que é morta.
A reverberação também varia conforme a frequência do som, por
exemplo: Uma sala pode ter bastante reflexão de graves e pouca de agudos,
tornando a sala "abafada". Um outro exemplo de sala com bastante
reflexão de agudos e pouco de graves nos dá a sensação de estarmos em uma sala
"magra". São os materias presentes na sala que regulam a
"cor" da reverberação. Uma sala toda revestida de azulejos, como o
banheiro, tem reverberação bem aguda.
Normalmente as salas de pequeno porte tentem a ser melhores quando
mais mortas que vivas.
D) Cálculo
do comprimento de onda
O cálculo do comprimento de onda é importante para podermos
ajustar o tamanho das salas de forma a não produzirem ondas estacionárias.
O cáculo é simples e feito da seguinte forma:
Pegue a velocidade do som e divida pela frequência, exemplo:
344m/s dividido por 50Hz = 6,88m
Isso significa que 50Hz tem 6,88m de comprimento. Se sua sala é menor que isso
não vai existir 50Hz inteiro dentro dela, apenas suas frações.
E) Ondas
estacionárias:
Com a fórmula acima podemos entender o que são ondas
estacionárias.
Se uma sala tem 3,44m em uma dimensão e um som de 50Hz é produzido
em uma das extremidades irá caber exatamente meia onda dentro da sala quando é
então refletida de volta. A onda na ida e na volta são praticamente a mesma e
por terem direções opostam acabam se anulando e as diferenças de pressão ficam
paradas dentro da sala, sendo o ponto máximo nas extremidades e ao meio a
pressão mínima, ou seja silêncio.
F) Modos e Cálculo
Modal
Modos
As salas onde produzimos música normalmente tem 6 paredes formando
3 eixos, portando produzem 3 ondas estacionárias relacionadas às 3 dimensões da
sala: largura, profundidade e altura, estes são os MODOS AXIAIS.
Quando a onda incide na diagonal à parede paralelamente a outra
formando um plano chamamos de MODOS TANGENCIAIS. Por exemplo: o som bate na
parede da esquerda, bate no fundo da sala, na parede da direita, na frente da
sala e volta ao mesmo ponto de onde saiu na parede da esquerda.
Quando um som completa um plano, mas passa por todas as paredes da
sala chamamos de MODOS OBLíQUOS.
Cálculo Modal
Quando andamos por uma sala com acústica problemática devido às
suas dimensões percebemos que determinados instrumentos tem um som mais alto ou
mais baixo em determinados lugares da sala. Isso deve-se às frequências
estacionárias dentro da sala e quanto menor for a sala, maiores são os
problemas com ondas estacionárias.
Para tentar minimizar este problema fazemos o cálculo modal da
sala para buscarmos as melhores dimensões para que estas não realcem nem
atenuem frequências.
Um gráfico ideal de densidade modal deve ter uma curva ascendente,
sem vales e picos pronunciados. Isso é relativo à quantidade de modos por
frequência, que devem aumentar gradativamente evitando-se muitos modos em
determinada frequência.
Critérios de Bonello
Quem rege um gráfico ideal de densidade modal são os critérios de
Bonello que indicam:
a) O número de modos por banda deve aumentar gradativamente ou, em
último caso, manter-se constante.
b) Se houverem dois modos coindcidentes em uma banda devem haver
mais três modos coincidentes na mesma banda.
c) Três modos coincidentes em uma banda é inaceitável.
OBS: Quando não há paredes paralelas usamos a média entre elas.
G)
Isolamento
O Isolamento do som é bastante simples de compreender, mas
bastante difícil de executar. Isolar um espaço é o mesmo que impedir o som de
dentro de sair ou o som de fora de entrar.
A primeira premissa básica enfrenta os vazamentos estruturais e
consiste na construção de paredes (chão e tetos inclusos) que vedem a passagem
mecânica do som. Uma boa técnica é conhecida como o princípio massa x mola x
massa, onde faz-se uma parede densa (massa), uma camada de material elástico
entre elas, como o ar ou lã de pet (mola) e uma outra parede densa. Muitos
projetos apostam nesse princípio, também conhecido como Box in a Box, onde
constroi-se uma caixa dentro da outra, ambas isoladas uma da outra através de
suportes de EVA (no chão), paredes afastadas umas das outras e estruturas
tensionadas por molas para ambos os tetos.
A segunda premissa básica é vedar a passagem aérea que acontece
por qualquer fresta. Desse modo evitamos também que o som escape de dentro de
uma sala para fora e vice-versa. Para isso toda fresta deve ser vedada,
inclusive os vãos da porta e fechaduras fazendo um contorno em toda a porta com
um perfil tipo "escadinha". Janelas fixas vedadas com vidros duplos e
até triplos são bons isolantes acústicos.
Dica: Uma técnica interessante é
uma pessoa utilizando um secador de cabelo apontado para as possíveis frestas
do lado de dentro da sala e outra pessoa do lado de fora verificando se escapa
algum ar. Pontos onde o ar passa devem ser "lacrados".
H) Planilhas
do Excel
Vamos utilizar duas planilha do conceituado Engenheiro Brasileiro
Sóllon do Vale. Ambas são gratuita e podem ser encontradas no site
musitec.com.br na área de downloads (clique aqui para fazer download) e com elas podemos calcular as melhores
dimensões para a sala que estamos estudando e escolher os melhores
revestimentos para podermos controlar a reverberação resultando em uma sala com
boa qualidade acústica.
a) Primero abra a planilha Modos e preencha as dimensões da sala a
ser estudada.
Nesse estudo iremos colocar os números 3 x 4 x 2,6, que representam
a largura (x), Profundidade (y) e Altura ou pé direito (z) normal da maioria
dos cômods das casas brasileiras.
Logo ao lado a planilha calcula automaticamente o gráfico de
densidade modal. Perceba que nesse exemplo que criamos a sala apresenta um vale
na região de 50Hz e também em 100Hz produzindo um gráfico muito ruim.
No gráfico modos por banda podemos perceber que não há um número
crescente de modos por banda, indo ao contrário do estipulado por um dos
critérios de Bonello, portanto ajustes na dimensão da sala devem ser feitos.
Normalmente não é possível aumentar uma sala, pois elas já estão
construídas, mas podemos diminuí-las facilmente colocando divisórias de dry wall
e tetos de gesso acartonado, por exemplo. Isso ainda nos favorece a
implementação do princípio massa x mola x massa ao enchermos os espaços entre
as paredes originais e as novas com lã de pet, por exemplo, para melhoraro
isolamento da sala.
Vamos então mudar o tamanho da sala para 2,8 x 3,8 x 2,4,
diminuindo 20cm as paredes e rebaixando o teto.
O gráfico da densidade modal melhora bastante, apresentando apenas
um pequeno vale na região de 63Hz e um pequeno pico em 80Hz.
E o gráfico de modos por banda também melhora e conseguimos
atender o principal critério de Bonello.
Agora que a sala já está do tamanho adequado precisamos calcular a
reverberação da sala por frequências para saber quais materias de acabamento
são indicados para esta. Abra então a planilha Reverb.
Primeiro faça uma avaliação da sala e preencha as medidas na
tabela de acordo com os acabamentos da sala, por exemplo: vamos supor que as
peredes são todas lisas e pintadas, incluindo o teto e temos chão sem
acabamento, aparecendo o contra-piso.
Uma lista de materiais estão na parte de baixo da planilha
indicando seu número.
Coloque o tamanho da sala na parte superior da planilha
Calcule a área de teto primeiro:
2,8m x 3,8 = 10,64m.
Preencha a primeira coluna (Material No.) com o valor 35, que é referente ao
meterial parede lisa pintada e coloque 10,64 na próxima coluna (Área).
Calcule agora as paredes individuais:
Esquerda = 3,8m x 2,4m (pé direito) = 9,12m
Direita = 3,8m x 2,4m = 9,12m
Frente = 2,8m x 2,4m = 6,72m total, mas nesta parede imaginamos
que temos uma janela de 1,5m por 1m, então subtraimos a área da janela
resultando no valor 5,22.
Fundo = 2,8m x 2,4m = 6,72m total, mas nesta parede imaginamos que
temos uma porta de 0,8m por 2,1m, então subtraimos a área da porta resultando
no valor 5,04
Agora calcule o piso:
2,8m x 3,8m = 10,64m e para este escolha o item 31 imaginando que
o piso está sem acabamento aparecendo o contra-piso.
Agora precisamos calcular as área das aberturas.
Imaginaremos que termos uma janela fixa com vidro grosso duplo de
1,5m por 1 em uma das paredes e uma porta de 0,8m x 2,1 em outra, para isso
iremos calcular essas áreas, escolher o material adequado inseri-los na
planilha e retirar suas áreas da parede em que estão, nesse caso a parede da
frente e do fundo, respectivamente.
Janela:
1,5m x 1m = 1,5m
Para este item escolhemos o item vidro grosso (33)
Porta:
0,8m x 2,1m = 1,68m
Para este item escolheremos o item Piso de madeira (32), pois
neste exemplo a porta é solida e feita de madeira.
Na parte de baixo escolha a quantidade de pessoas no ambiente,
pois pessoas também são absorvedoras e difusoras e influenciam na conta:
escolheremos aqui 1.
Pronto, agora vamos dar uma olhada nos tempos de reverberação da
sala de acordo com cada frequência:
Olhando o gráfico resultante vemos que há mais reverberação nas
frequências mais altas do que baixas e que a frequência de 500Hz tem reverberação
alta, maior que 1s.
O gráfico ideal da densidade da reverberação tende a ser uma curva
descendente imaginando que da metade para a esquerda esteja por volta de 50%
acima do meio e da metade para a direita 50% abaixo, ou seja a nossa curva atual
está ao contrário.
Para esta sala pequena que tem foco na produção musical almejaremos
a reverberação de graves por volta de 0,5s, de médios por volta de 0,3s e de
agudos por volta de 0,2s. Esses valores são realtivos ao tamanho da sala e sua
finalidade. Por exemplo: Um auditório de 1000m quadrados com RT60 em 500Hz de 1
segundo é uma sala com pouquíssima reverberação, dizemos: - morta. Ao
contrário, uma salinha de 20m quadrados com o mesmo RT60 já pode ser
considerada bem viva.
Normalmente estúdios de gravação tem um RT60 em 500Hz próximo ao
1/2 segundo.
Vamos então começar a substituir os materias das paredes.
Primeiro substitua o piso de concreto por carpete grosso sobre
feltro, item número 28. Perceba que imediatamente o gráfico já toma uma forma
amistosa.
Agora precisamos achar um material que absorva bem as frequência
altas, pois precisamos abaixá-las um pouco para gerar a curva descendente na
parte da direita.
Olhando na tabela de materiais percebemos que lã de vidro (lã de
pet atualmente) com 50mm de espessura tem alta absorção na região de 1000Hz a
4000Hz, com índice próximo a 1.
Vamos então revestir toda a parede da frente (onde tem a janela) com
esse material, substituindo a parede com 5,22m com material 35 por material 2.
Percebemos que melhora bastante.
Dica: A forma de aplicação desse
material na parede é feita através de caibros pregados à parede e a lã de pet
entre eles. Depois um tecido bem poroso grampeado recobre toda a área para dar
acabamento.
Vamos agora colocar espuma em relevo de 50mm de espessura que
também tem boa propriedade acústica sintonizada para agudos no teto,
substituindo o material 35 por pelo 5.
Pronto, nossa sala está com boa resposta de reverberação.
Dica: Podemos colocar apenas
metade da espuma no teto e a outra metade distribuir pelas laterais da sala,
criando um visual mais atrativo.
Isso também é interessante de acordo com uma das técnicas de
projeto de estúdio que privilegia uma área mais absorvente próxima aos
monitores e uma área mais difusora oposta.
Para finalizar o projeto coloque alguns difusores tipo QRD que você mesmo pode construir com tocos de madeiras colados em uma base de compensado para pendurar nas paredes, veja esse exemplo e o mapinha de construção.
Taí, umas técnicas simples para deixar a sua sala falando bonito.
Para finalizar o projeto coloque alguns difusores tipo QRD que você mesmo pode construir com tocos de madeiras colados em uma base de compensado para pendurar nas paredes, veja esse exemplo e o mapinha de construção.
Comece cortando uma chapa de compensado de 40 mm de espessura de 60 cm x 60 cm, depois cole os tocos conforme os tamanhos e o mapa.
0 - não coloque nada
1 - toco de 5 x 5 x 4,76 cm (38 peças)
2 - toco de 5 x 5 x 9,25 cm (38 peças)
3 - toco de 5 x 5 x 14,28 cm (40 peças)
4 - toco de 5 x 5 x 19,05 cm (15 peças)
Taí, umas técnicas simples para deixar a sua sala falando bonito.
Excelente aula. Obrigado por ela e pelo projeto de difusores que não tinha construído ainda por não confiar em meus palpites sobre acústica. :)
ResponderExcluirOi, eu que agradeço por você ter gostado! Abs.
Excluircomo acessar as planilhas excell?
ResponderExcluirOlá, elas estão no site da Musitec para download na parte inferior do site. Se você precisa do Excel você pode usar a versão do Open Office, que é gratuito. Abs.
Excluircara, muito bom..teroricamente vc resumiu as principais aulas do livro do Solon do Vale em uma só. Gostei muito e parabéns pelo trabalho! Estou com algumas dúvidas. Consegue me ajudar por email ou facebook?
ResponderExcluirObrigado.
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ResponderExcluirNEET Result 2017
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